Princesa Isabel é uma pérola encravada no Sertão
paraibano, na fronteira com Triunfo, Quixaba e Flores, municípios pernambucanos.
Lá estive no limiar dos anos 80, onde conquistei amigos de vários matizes
sociais. Lagoa de Cruz, um pequeno povoado, era onde buscava uma prosa
sossegada com dona Úrsula, uma sábia mulher quase centenária, à época. Havia
sempre uma história para contar, mas vivia apreensiva com a Guerra das
Malvinas, naquele abril de 1982. Para ela era perigoso aquela guerra bem ali,
nas ilhas Falklands, a apenas a 480 quilômetros de Buenos Aires. Decerto lembrara dos idos de 30, com sua Revolução e Princesa se tornando Território Independente!
“É preciso ter cuidado, Almeida, volte pelo aceiro
da estrada, não deixe que ninguém o veja, nunca se sabe quando um canhão deles
vai estrondar por essas bandas. Eu mesma não saio de casa. Fico aqui, com meu
banquinho na janela. Qualquer coisa corro pra debaixo da cama, não vou esperar
tempo ruim. Isso é o fim do mundo, já dizia Padim Ciço”. Aquela mulher
demonstrava segurança no que falava e eu, mesmo sabendo da enorme distância entre
o lugar dos conflitos e Lagoa de Cruz, levei algum tempo em minha volta para
Princesa, pelos aceiros que me indicara. Sabia-se lá o que ingleses e argentinos
possuíam em armamentos bélicos. Não tive medo, claro, mas duvidar integralmente
de dona Úrsula, não iria arriscar. Era pra lá de sábia.
Volto a pé, uma boa caminhada à sede do município.
Esqueço a prosa com dona Úrsula, vou me deliciando com o cheiro de terra
molhada, caíra uma chuva trazendo alegria e um tanto de verde à paisagem ressequida.
Queria ver a água sob a ponte que estava logo ali, já em meu campo de visão. Algo
me chama a atenção. Não sabia discernir o que fora, mas vira um corpo se mexendo, ora
pra baixo, ora para cima, como se fora alguém à minha espreita. Parei! Lembrei
dos conselhos de dona Úrsula e das trincheiras da Revolução de 30. Não havia em
mim vontade nem coragem de seguir. Era um escuro de dar medo. Não via um farol
de automóvel que me socorresse do pânico instaurado.
“Correndo o bicho pega, ficando o bicho come”,
resolvi de olhos semicerrados enfrentar o perigo iminente. Fui chegando perto,
trêmulo, desabei. Ri como poucas vezes sorrira. Uma jumenta servia-se da
vegetação que se levantara no aceiro do asfalto. Aquilo servira de janta para
ela, pânico para mim. Só agora trago à tona aquele episódio sórdido. Ao
contrário do que muitos pensam, mijei nas calças!
Sempre gostei daquelas histórias contadas nas calçadas, da madrugada!
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