domingo, 28 de setembro de 2014

Viagem no tempo II

Insurreição - um vagão velho de trem - era aquela estaçãozinha ferroviária, encravada na Serra das Russas, a menor existente naquele percurso rumo à Belo Jardim. O barulho do trem sobre os trilhos estão gravados em minha memória. Era musical com a locomotiva movida à lenha, puxando o comboio: Chá-com-pão-bolacha-não, chá-com-pão-bolacha-não! Em Caruaru, além de guloseimas, nos eram oferecidos os bonecos do mestre Vitalino, a arte de barro tinha lugar na volta, encomendadas pelos amigos de Tejipió. A feira de Caruaru estava ali, bem ao lado, com suas tralhas, mangaios e encantos: Com “... cesto, balaio, corda, tamanco, gréia, tem boi-tatu; tem fumo, tem tabaqueiro; feito de chifre de boi zebu; caneco a cuvitêro, penêra boa e mé de uruçú; tem carça de arvorada, que é pra matuto não andá nú...”.


E aquele “imbua de ferro” ziguezagueava até denunciar sua chegada passando pela lagoa de Itacaité, lugarejo onde nascera meu avô paterno, seu Cândico, chamado Cãido pela vizinhança. Não tive a felicidade de conhecer minhas avós Maria e Luzia, paterna e materna respectivamente. Meu avô paterno nascera em Cavalo Morto, comunidade ao norte daquele município. Pela janela já se via as águas do Bitury, cortando as terras da Lagoa do Capim, fazenda que deu origem ao município de Belo Jardim. Todos nós nos posicionávamos às janelas para receber os acenos vindos da casa do tio Zé Primo e tia Quitéria. Lá estavam eles, a espreita do comboio, recém-chegado de Recife.


A algazarra, agora, era pela descida onde pessoas se aglomeravam às portas e estribos dos vagões. As malas dispostas na calçada da velha estação ferroviária, hoje ao relento, trazendo as marcas do tempo e descuido com sua arquitetura e história. A carroça já estava abarrotada de trecos desembarcados, nós a acompanhávamos e tudo aquilo já era prenúncio da grande festa de São Sebastião, em seu dia 20 de janeiro. Os abraços quase não cessavam à chegada e a casa estava cheia de receptividade, gente e alegria. O almoço já estava servido e a mesa posta, invariavelmente, com fava, macaxeira, farofa de jerimum, carne de sol e muita conversa para se colocar os assuntos em dia. Ali estávamos todos nós num clima de confraternização em família. Ao contrário do que muitos pensam, os dias que se seguiriam eram de muita música, encontros e cultura também na religiosidade.

sábado, 27 de setembro de 2014

Viagem no tempo I

Janeiro era tempo de férias, viagens e promessas. Acordávamos ainda de madrugada, as malas já dormiam prontas e colocadas à porta aguardando mãos que as conduzissem à estação de Coqueiral. Entre o incômodo da sonolência e a alegria daquelas viagens lá íamos nós com destino a Belo Jardim, terra natal dos meus pais, lugar onde passei parte de minha infância. Éramos seis e a nós se juntavam, ainda e invariavelmente, as primas Jerusa, Jurema e Jaciara, filhas do tio Etelmino e tia Quitéria. Meus primos, filhos de Quitéria de tia Aninha, eram como irmãos, algo muito comum àquela época. Na estação ferroviária havia uma aglomeração à espera do “Trem da Serra”, comboio que se destinava a Salgueiro, alto sertão pernambucano.

As primeiras viagens se deram com a “Maria Fumaça”, queimando lenha e ziguezagueando pela linha férrea, mundo afora. Iniciava-se a viagem com um alvoroço de gente e bagagem à procura de suas poltronas. Lá vinha o fiscal com trajes em cáqui e quepe de aba preta, o alicate furador marcando os bilhetes. Papai e mamãe tratavam de nos acomodar da melhor maneira possível em meio àquela algazarra. Ninguém queria ficar distante das janelas só permitidas aos adultos ou jovens, às crianças se recomendavam as cadeiras dos corredores. Já às crianças de colo eram permitidas a visão das janelas, sem nada entenderem do que viam. Eu ficava de olhos grudados na paisagem que pareciam correr em sentido contrário. Passavam rápidas, eram sucedidas por outras e outras, outras mais.
Por nossas retinas passam o verde do aveloz compondo os cercados, delimitando propriedades, sombreando as estreitas estradas que levavam nosso olhar a algures e animais pastando, correndo pelos campos próximos e distantes, alheios a alegria que sentíamos naquela vivência. Havia, ainda, os túneis a serem vencidos pela locomotiva, era uma sensação de angústia ao penetrar aquela escuridão e alívio com os raios de luz no fim do túnel, literalmente. Ao contrário do que muitos pensam, chovia e aquele cheiro de terra molhada invadia os vagões onde se ouviam vozes desencontradas. A chegada noutra estação era anunciada pelo apito e o atrito do freio entre rodas e trilhos. Aí se dava a venda de tapiocas, mariolas, sequilhos, bolos de mandioca (o manuê), frutas da época, roletes-de-cana, cafezinhos... Dali a pouco a partida com outro apito da “Maria Fumaça”. E nós abstraídos com toda aquela beleza.

quinta-feira, 25 de setembro de 2014

Errado pra cachorro!


Era ainda a primeira metade da década de 60. Os filhos de seu Tuta e dona Geraldina já estavam crescidos ou não queriam “acender vela” para Eliane e Nonato, daí eu era convidado pela mãe da moça a prestar esse papel. Lá íamos eu, Lila e Nonato, o namorado. No Cine São José, em Jaboatão - que nem sonhava ser “dos Guararapes” - como já combinado, eles entravam para assistir à sessão e eu ficava à porta trocando meus gibis. Um desses filmes eu guardo bem na lembrança, era “Errado pra Cachorro”, Jerry Lewis no papel principal. Os namorados depois me contariam o filme tim-tim por tim-tim, para que não caíssemos em contradição na hora de prestar contas da companhia de Lila, a filha de seu Tuta.  

Eu me fartava com as histórias dos gibis dos colegas. Tornei-me perito em memorizar e enfeitar aquelas histórias em quadrinho para encher a vista e os ouvidos daqueles que se aventurassem a uma troca: Um gibi meu valia, no mínimo, por dois dos circunstantes frequentadores do cinema. Dava ênfase a cada frase memorizada com capricho. Precisava levar novos gibis para casa, e não havendo dinheiro para compra-los, apelava para a artimanha dos contos fabulosos. Sempre deu certo! Lembrei-me desses episódios hoje, pela manhã, quando merendava num dos quiosques da Central de Aulas da UEPB, o já tão popular Titanic.

Um cãozinho faminto se achegou à mesa onde me encontrava quando alguém, resmungando, o expulsa do recinto. Em seguida vem a legenda: “Não tenho cachorros pra dar de comer”. Ignorando o gesto e a pessoa lembrei-me de uma estória que ouvira no ônibus dos estudantes, ontem, à caminho da universidade, pela boca da professora Vanessa. O episódio do quiosque era o mesmo, agora uma cadelinha com talento para atriz. Conta Vanessa que a cadela a olhava com os olhos teatrais, depois arrastava as patinhas pelo chão, causando dó aos que se encontravam ao redor da mesa. Uma vez servida e saciada a cadela saiu à francesa, sem nenhum sinal que denotasse defeito físico ou coisa que o valha. Saiu descaradamente como se teatro fizesse.

"A cadela demonstrava mais talento que Fernanda Montenegro, a diva do teatro brasileiro", assegura Vanessa. Ao contrário do que muitos pensam errada pra cachorro, estava o dono daquele quiosque!

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

A defesa de Clara


Essa é minha amiga Clara e esse é seu cachorrinho Lupi, antes da partida. Certa vez contei aqui como se deu a viagem de Lupi e, se falei de modo metafórico, foi porque o momento não era propício para uma verdade tão nua e tão crua. O fato é que Lupi saiu de casa e não voltou. Conjecturei, à época, que ele talvez tivesse sido convidado a visitar o Asteroide B-612. Para quem não faz ideia do que estou falando, explico: Fica lá onde é ali mesmo! Seu habitante, em sua última visita à terra, não era afeito a responder, mas a indagar. Clara sabe hoje, mais que ninguém, que estou tratando aqui do pequeno Príncipe, aquele menininho sabido que cuida de sua rosa, a única em seu planeta. E ele só perguntava, perguntava, perguntava...

E, por falar em perguntar, respondo, às várias indagações de amigos sobre o por quê não mais me aventurar no Bate-papo do Face, da mesma forma como dantes. Invocarei a opinião de Clara porque sei que essa amiguinha, levada pala razão, razão encontrará em minhas ponderações. Ela, num piscar de olhos, entenderá se eu expuser minha entrega à Filosofia em prol de melhores resultados, aqui não entendidos como notas ou médias altas. Agora mesmo solicitei (acordadamente com meus superiores) um período de férias na prestação do serviço público. Além do mais tenho no ENEM a possibilidade de melhorar meu baixo coeficiente. Isso demonstra quão eficiente não estou sendo.

Clara sabe das agruras na vida de um adulto. Conhece os meandros da atribulada rotina que nos impele a correr atrás das contas, contratos, distratos não tão atrativos. Contas-a-pagar, compromissos aqui e acolá, textos a ler, elaborar e contextos a serem vivenciados. Ela mesma já vive rodeada de tarefas. Brincar, pular, cuidar e guardar os brinquedos, ir à escola, fazer tarefas... Ufa! Esse mundo infantil também é assoberbado, gente. Por essas e outras é que Clara me dará razão. Amigos, amigos jamais serão esquecidos. Ao contrário do que muitos pensam, fico ali, na espreita, como bem diz Djavan, n’A rota do indivíduo: “...Te vigia como mãe que dorme olhando os filhos com os olhos na estrada...”. “Coisa pra se guardar do lado esquerdo do peito”, diria Milton.

Um dia a gente se encontra!

domingo, 21 de setembro de 2014

Tarefas, pregões e saudade!

Ultimamente vivo que é uma saudade só! Encerradas as tarefas caseiras, aquelas que a mulher diz: -Faça! E agente segue àquela velha máxima: “Manda quem tem juízo, obedece quem pode”. Então fui à luta e me arvorei contra o Aedes Aegypti, aquele mosquitinho causador da dengue. Eu, acometido que fui, já por duas vezes, corri a limpar reservatórios e recipientes que pudessem abrigar esse terrível hospedeiro quando, do nada, recebo um convite amigo: “Vem assistir a corrida e tomar uns goles”. Sem muita delonga me certifiquei que a corrida era a Fórmula 1, já os goles oferecidos seriam de cerveja. Domingo, corrida, cerveja... Afff Tudibom! Mas recusei e ouvi o “resmungo” do outro lado da linha: “Vi você na caixa-d’água e ainda diz que não tem tempo pra uma cerva, né!”. Ao contrário do que muitos pensam, agradeci o convite ressentido menos pela corrida, mais pela cerva. Entre tomar cerveja ou cuidado, preferi o cuidado contra o mosquito. 


Tarefa encerrada e mulher satisfeita, fui ao lazer porque ninguém é de ferro. Armei a velha rede e apertei o “pitoco” da saudade. Passeei pelas ruas e ruelas da minha Recife, cruzei o Capibaribe, fui ao Beco-da-fome, passei pelo Teatro do Parque, voltei pela Sete de Setembro, dobrei pela Aurora, parei na ponte da Boa Vista. Ali lembrei duma proeza de seu Silvestre que pulou da ponte (nos anos 40) em busca de um chapéu-coco que caíra pela ação do vento. Um mergulho, um susto e o chapéu: são, molhado e salvo em suas mãos. Dali fui à estação central da Rede Ferroviária, hoje Museu do Trem. Aquela “Maria-fumaça” já me dera muitas alegrias em viagens sem fim pelo interior, rumo a Belo Jardim. Viagens cujas narrativas, aliás, me foram cobradas pela prima Jurema, aqui mesmo no Banzo Dominical. 

“Pelas ruas do Recife, todo dia sem parar, se ouvia essa cantiga conhecida no lugar: Eu tenho lã de barriguda pra travesseiros. E o vendedor de pitomba, alegria da mocidade seguia sempre cantando pela ruas da cidade: Chora menino pra comprar pitomba, chora menino pra comprar pitomba. Quem foi menino em Recife ainda deve se lembrar de quantas vezes chorou por bolinha de cambará. Eu tenho bolinha de cambará, um pacote é um tostão, bolinha de cambará cura tosse e constipação. Vendedor de macaxeira, passava todo dia com macaxeira-rosa e macaxeira baía: Caxeeeeeira! Macaxeira-rosa! É rosa e baía! Cozinha na água fria, dona Maria! E o vendedor de vassoura parecia um embolador, cantava num só fôlego, era um pregão de valor: Vassoureeeeiro! Bascuiador, espanador, esteira d’Angola, colher-de-pau, raspa-coco e gréia! Eu tenho quartinha e mé novo, mé novo de engenho”.


Abraço a Gilvan Chaves: Saudosa memória!

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Um fio de humildade

Por favor! Por obséquio! Muito obrigado! Bom dia! Boa tarde! Boa noite... Essas raridades, ou parte delas, eu as aprendi com meus pais. Muito mais aprendi com meu sogro, Silvestre Batista. Penso que seu Silvestre levou ao túmulo e os sepultou consigo. Há coisas que a gente aprende no périplo pela vida afora, às vezes, a custa de muita dor. Mas se aprende. Há uma distância enorme entre aprender e praticar, vivenciar, presentear ao outro ou aos outros a lição apreendida.
Eu, por exemplo, aprendi com muita dor a pedir desculpas e perdão. Da mesma forma aprendi a desculpar e perdoar. Não é fácil, é um exercício que se faz em busca de crescimento espiritual e não só por isso, pois pareceria barganhar com a eternidade ou coisa que o valha, dependendo de pontos de vista. Ao túmulo, a exemplo de Silvestre, levarei as desculpas e perdões que pedi; as desculpas e perdões que concedi. Quem me conhece sabe e atesta o que escrevo. Alguns episódios públicos, inclusive, avalizam o que escrevo: Dito e feito!
Há um episódio, porém, que levarei ao túmulo como imensurável incômodo, algo que o tempo não conseguiu deletar/excluir da minha memória. Fui rude, áspero e impiedoso com um superior nos tempos de Carmelo, o Frei Pio Moreira. Homem culto, polido, comprometido com os votos que fizera. Tomando as dores de um companheiro seminarista, entrei num embate com o Frei Pio e disse-lhe, em meio a uma liturgia de Missa Campal, que “tinha por ele a mesma antipatia que ele nutria por mim”. Uma fogueira ao centro, os membros da fraternidade em volta, e um recorte de papel onde seria posto o que se queria esquecer, perdoar ou ser perdoado.
Relatos me foram feitos que o Frei Pio Moreira recostou-se à parede do Convento (Camocim de São Félix) e, com lábios trêmulos, ouvira meu desabafo. Veio o Abraço da Paz, nos abraçamos, seguiram-se os ritos da Santa Missa. Permanecemos no mesmo patamar dantes. Dali a poucos meses deixei o seminário por questões outras, certamente por não ser vocacionado. Nunca tive a chance de exercer um fio sequer de humildade. Não me desculpei, nem pedi perdão. Hoje até que poderia, amadurecido pelo tempo. Ao contrário do que muitos pensam, não há como fazê-lo: Frei Pio Moreira não está mais entre nós.
E isto também levarei ao túmulo!

domingo, 14 de setembro de 2014

Vivência


Hoje, pela manhã, algumas décadas mais tarde, curtindo o mar de Cabo Branco, escutava uma música que me remeteu a essas tão remotas lembranças. Aquela melodia, aquela letra me transportaram àquele "arruado", onde bem de longe se ouvia o canto do Procnias nudicollis, o popular “ferreiro”, o pássaro araponga. Aquela casa rodeada de árvores e gaiolas nos alpendres enchiam nossos olhos de espanto e prazer com suas maravilhas. Aos 12 anos não tinha a mínima noção de ecologia, nem a concepção de que aqueles passarinhos nos encantariam muito mais se soltos estivessem na natureza.

Estávamos na segunda metade dos anos 60. Seu Orestes cuidava de suas gaiolas e dos apiários naquela casa grande de esquina, lá na Rua Guanabara, em Tejipió. Seu Orestes era um homem de fisionomia fechada, calvície bem acentuada e seus poucos cabelos brancos. A dona da casa, dona Rosa Álfaro de Vasconcelos, era mulher prendada nas artes culinárias. Lá comprávamos mel das abelhas de Seu Orestes, dona Rosa nos atendia com toda presteza. A compra do mel era uma bela desculpa para ouvir, daquele homem de feições rudes, seus conselhos e ensinamentos sobre como lidar com aves e abelhas. Em minha mente de criança seu Orestes era um coronel, com aqueles trajes sempre em linho branco e sua cadeira de balanço empalhada.

A música que tocava os meus ouvidos e os de Evaldo Brasil intitula-se Vivência, composição dos anos 70, dos meninos sabidos da Banda de Pau e Corda: “Quem nasceu lá e viveu / Crescendo percebeu / O canto do ferreiro / Da casa do doutor / O velho mensageiro / Das cartas de amor / O homem, o vassourão / Limpando o chão da manhã / Sabe, crê e chora  / Vive cada hora / No canto do ferreiro / Da casa do doutor...” Aí me perdi no tempo, carecendo que o camarada Evaldo me despertasse para o mundo real, onde outra canção já enchia a casa de poesia. Entro em novo êxtase ao ouvi-la: A Banda! Era Chico Buarque que, sem pedir licença nos convidava a vê-la passar. Ao contrário do que muito pensam, havia licença sim. Chico tem toda licença poética!

https://www.youtube.com/watch?v=g_u3Y-t1B-4

domingo, 7 de setembro de 2014

Essa palavra SAUDADE!

Ela chega e vai embora sem dar notícias. De repente, não mais que de repente, aparece e me enche o peito de sua presença deixando meus olhos marejados. Pinto de Monteiro (A Cascavel do Repente), traça sua forma de ver essa minha companheira d’agora: “Essa palavra saudade / Conheço desde criança / Saudade de amor ausente / Não é saudade, é lembrança / Saudade só é saudade / Quando morre a esperança”.


Acordo, faço a toalete matinal, tomo aquele café quentinho nesta manhã fria de domingo. Ainda não me emancipei da saudade para a qual não há um grito de independência. Há uma forma de vê-la diferente, ao gosto de Ana Débora, a Mascarenhas d’O Mundo e Suas Voltas. Ela trata saudade apenas como lembranças, assim como as lembranças da dona Teté! Mas voltemos ao café quentinho desta manhã que me abduziu no tempo e no espaço. Levou-me a uma memória dos tempos de criança, com aquele café à mesa farta de tudo, inclusive da boa prosa. O rádio ligado na PRA-8, com Aldemar Paiva e o “Pernambuco Você é Meu”, onde a poesia e a descontração corriam soltas. A TV era só ligada à tarde, mas o rádio era a diversão preferida, pois havia o futebol nas resenhas esportivas.

“Aquele café torrado / De forma muito singela / Num caco ou numa tigela / Tinha o sabor destacado / Depois de feito coado / Mamãe pra mesa trazia / O aroma se estendia / Pelo casarão inteiro / Eu ainda sinto o cheiro / Do café que mãe fazia”. Domingo era dia de ir à missa, visitação a parentes ou presídios e hospitais. Havia muito além disso, tudo era festa. Andar de bonde (auto motriz) pelas ruas do Recife é algo inesquecível. Abraçar aquele baobá em frente ao Palácio das Princesas, contemplar o Teatro Santa Isabel, ali ao lado, me deixava deslumbrado. Não entendia muito bem a função das estátuas fincadas nas praças recifenses. Joaquim Nabuco estava ali, olhando o Capibaribe que desfila suas águas por sob a Duarte Coelho. O bonde sobre ela também desfilava, ao contrário do que muitos pensam. Aí caminhávamos pelas Ruas da Aurora, Velha, Nova, Concórdia, Flores...

Por entre elas sigo eu vagando em minhas memórias nesta fria manhã.




segunda-feira, 1 de setembro de 2014

Ah, braço!

Só pra desencanar! Aperta daqui, aperta dali e cá estou eu, mais uma vez, estropiado. Agora preciso desencanar, usando uma linguagem juvenil. Um quase sexagenário usufruindo dos sintomas da juventude. Podes crer! Não, essa não, podes crer é cafona paca, nos dias atuais, já caiu em desuso, manos. Irado é dizer: Tô bolado, com essa parada de água. Dou-me aos encanamentos nos fds e feriados, coisa interminável. É que prefiro curtir este trabalho em função da natureza, saca! É uma parada sinistra e, se tudo se encaminhar bem, ficará milgrau. As mina sabe que sou antenado nessa onda ecológica. Isso é de lei. Mas, ás vezes, fico com cara de mané, pagando um sapo e a água não chega. Aí eu pago um mico, até parece que querem trolar, zoar comigo, né chapa! O importante, nisso tudo, não é esse “machucado” no antebraço, uma “distinção maiuscular”, como diria meu parceiro Jerimum. Aqui não tem caô, não quero dizer o que não faço, comigo é dito & feito, ao final sei que vai rolar uma onda legal de água potável com potabilidade para o consumo humano. Sinistro, né!


Não faz muito tempo e aqui estive prestando queixa – quase um B.O. – com um braço em tipoia. "Ossos do ofício" de um faz-tudo que ousa reaproveitar tão precioso líquido. Advertido pelo mestre João de Patrício, não dimensionarei o líquido em quantidade, mas em qualidade. Água saborosa após tratamento caseiro: Areia e brita em camadas sobrepostas, uma bobona de 200 litros, certa mão-de-obra, porque não surge como um relâmpago. No mais é saber que a família e os muitos amigos frequentadores da casa de “Silvestre Batista” terão a certeza de não serem contaminados pela ingestão, mesmo indireta (nos banhos) pela água. Pasmem, estamos tratando de água, e o contrassenso é que esse líquido da vida 3,5 milhões de mortes por ano no mundo, segundo a Organização Mundial de Saúde – OMS.

Em evento cuja temática era a água, realizado pelo Projeto Rio Mamanguape, tive a oportunidade de expressar minha preocupação – e lá se vão alguns anos – com a captação das águas de chuva não só nas moradias rurais como urbanas. Principalmente na urbana onde há uma enorme concentração de moradias sem nenhum aproveitamento dessa água que cai, deita, rola sem nos deixar um pingo represando. E, se lembro a captação, não posso deixar de exaltar o bom uso e o reuso de tão precioso líquido. Deveria haver um sistema de permuta entre governos e a cidadania. A captação se daria com incentivos sejam lá de que forma fossem, mas que existam e contribuam para equilibrar mais e mais nossa convivência com as estiagens.

Falei de água só pra desencanar, ao contrário do que muitos pensam: Abraço!