quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Virou fumaça

Havia o “Música para Todos” e nós, pela proximidade com o Edifício Tereza Cristina, margeando o Capibaribe, éramos assíduos frequentadores. Aquele projeto dava oportunidade de se conhecer a música erudita através da Orquestra Sinfônica do Recife com a pompa e circunstância do Teatro Santa Isabel, palco das apresentações. Tornamo-nos (quase) íntimos do maestro Eleazar de Carvalho, seu regente à época. Eleazar inovou o repertório da orquestra com célebres peças musicais como Zaratustra e Don Juan (Strauss), além de obras de StravinskiDebussy e Ravel, cujo legado foi abraçado pelo maestro Eugene Egan, seu assistente. 
Numa daquelas apresentações, traído pela memória, tive que abandonar o concerto, saindo às pressas por entre as filas de cadeiras e a plateia que lotava o Santa Isabel. No meio do “Coro dos escravos hebreus”, fragmento de Nabuco, ópera de Giuseppe Verdi, lembrei-me de algo que não devera esquecer. Havia deixado uma panela comum com macaxeiras ao fogo, enquanto tomava um rápido banho, antes da saída ao teatro. Por mera precaução não quis utilizar panela de pressão, na possibilidade do esquecimento. O fato é que esqueci, o “Música para Todos” me tomara toda a atenção, naquela tarde, pelas obras anunciadas.
Saí desembestado, como diria minha mãe, pela Rua do Sol, parei próximo à ponte Duarte Coelho, olhei para as imediações do Tereza Cristina, buscando algum sinal de fumaça. Nada pude perceber dali, mas ao avançar pelas Ruas da Aurora e Clube Náutico Capibaribe, esquina do Cine São Luiz, vi o estrago que fizera. No quinto andar não dava para divulgar as janelas da nossa quitinete, era fumaça só. O síndico já estava a postos, iniciaria o arrombamento na tentativa de evitar maior propagação do fogo que não se dera. Ao contrário do que muitos pensam, onde há fumaça, necessariamente, não há fogo. A panela com macaxeiras virou cinzas e, minha ópera, fumaça!

Nenhum comentário :

Postar um comentário